A CEO da Fraport, Andreea Diana Pal, reafirmou nesta quinta-feira (8), em entrevista ao Gaúcha Atualidade, que não é responsabilidade da empresa arcar com os custos da remoção de moradores da Vila Nazaré, necessária para a ampliação da pista do aeroporto Salgado Filho. O impasse sobre a operação chegou à Justiça, que fará nesta quinta a primeira audiência de conciliação entre a concessionária e o Ministério Público Federal (MPF).
A ampliação da pista permitirá ao aeroporto receber aeronaves de maior porte e é considerada a principal obra prevista para ocorrer nos 25 anos de concessão. Segundo a executiva da Fraport, o contrato "é muito claro".
As responsabilidades e os gastos envolvidos na desocupação e na realocação das famílias se converteram em motivo de divergência entre Fraport e o MPF, que ingressou com ação judicial requerendo que a empresa alemã assuma os custos. A concessionária, contudo, avalia que deve prestar apenas auxílio na desocupação, sem gastos adicionais com reassentamento ou realocação.
— A situação é mais ou menos absurda. Temos 1,2 mil famílias que vivem em condições insalubres (...) Temos casas muito boas, tudo preparado para receber as famílias, e agora paramos tudo. Não sei por quê — disse Andreea.
A audiência de conciliação desta quinta-feira será conduzida pela juíza Thais Helena Della Giustina, responsável pelo caso, e terá o objetivo de buscar acordo entre as partes sobre custos da remoção.
— A Fraport vai dizer (na audiência) que não é nossa obrigação (...) O estudo não tem nada a ver com o contrato. Isso foi confirmado pela Anac, que assinou o contrato. O MPF está construindo algo que, do ponto de vista jurídico, não dá — afirmou Andreea.
O MPF ingressou, em julho, com ação civil pública alegando que o contrato de concessão prevê que a Fraport é a responsável pela remoção das famílias, devendo arcar com eventuais custos decorrentes disso, como realocações e reassentamentos. O órgão requer que a concessionária ofereça terceira solução habitacional ou auxilie as famílias na compra assistida de imóveis, como foi feito na obra da nova ponte do Guaíba. O MPF calcula que o custo para a Fraport é de R$ 146 milhões.
Assinado em julho de 2017, o contrato de concessão do Salgado Filho está no centro da queda de braço entre a empresa e o MPF. A página 12 informa que eventuais desocupações das áreas do sítio aeroportuário, em posse ou detenção de terceiros, são de "integral responsabilidade da concessionária".
Na página 24 do documento, está determinado à concessionária "promover a desapropriação dos imóveis necessários à realização de investimentos ao longo da concessão cuja fase executória não tenha ainda sido iniciada, e indenizar seus proprietários".
O item cita que deverá ser observado o inciso oitavo do artigo 29 da Lei de Concessões, o qual diz que podem ser declarados de utilidade pública bens necessários para a execução de obra, com autorização para desapropriações, sendo da concessionária "a responsabilidade pelas indenizações cabíveis".
A partir da página 36, são listados riscos assumidos pela concessionária, como "custos decorrentes das desocupações do sítio aeroportuário referidas no item 3.1.50, bem como de eventuais reassentamentos e realocações".
Na página 8 do anexo 2 do contrato, no Plano de Exploração Aeroportuária, está registrado: "Caberá à concessionária tomar todas as medidas necessárias à imissão de posse nas áreas ocupadas por terceiros (...), arcando integralmente com o ônus decorrente de tais providências".
A Fraport rebate afirmando que a Constituição atribui ao poder público responsabilidade pelas políticas habitacionais. A empresa entende que "há obrigação de desocupar, mas que isso não se confunde com reassentamento". Dessa forma, a avaliação da concessionária é de que os custos se limitariam às ações necessárias para a reintegração de posse.
Em fevereiro de 2019, antes de o caso ser judicializado, a Fraport apresentou às autoridades plano de remoção da Vila Nazaré ao custo máximo de R$ 29,2 milhões. A proposta atendia 930 famílias do sítio aeroportuário. O MPF não aceitou por considerar os valores insuficientes. Além disso, seria necessário discutir o destino de outras cerca de 500 famílias que não estão na área aeroportuária, mas que possivelmente terão de ser removidas. |