ALEXANDRE PELEGI / JESSICA MARQUES
Um levantamento feito pela NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos) mostrou que o sistema de transporte público do Brasil teve uma perda diária de 3,6 milhões de passageiros em 2017. O número representa redução média de demanda de 9,5% com relação ao ano anterior.
Segundo a NTU, a redução é a terceira maior desde o início da série histórica. Os dados são do Anuário 2017-2018, feito pela associação.
Além disso, o estudo mostra que o transporte público por ônibus perdeu 35,6% dos passageiros pagantes em mais de 20 anos. Segundo a NTU, a perda explica o aumento das tarifas, por serem menos usuários rateando os custos da operação.
A associação aponta ainda que a oferta do serviço não é reduzida na mesma proporção da queda do número de usuários. Mais um fator para justificar o aumento das tarifas, na visão da NTU.
“Outro agravante da situação é a sobrecarga das gratuidades concedidas a estudantes, idosos e outros passageiros definidos em lei, que em um ano passou de 17% para 20,9%. Isso significa que um em cada cinco passageiros viaja de graça atualmente; como esse custo também é rateado entre os usuários pagantes, o maior o peso das gratuidades também encarece o valor das tarifas”, informou a NTU, em nota.
Por fim, o estudo mostra que a diminuição da demanda foi agravada nos últimos cinco anos. Desde 2014, foi acumulada uma perda média de 25,9% dos passageiros pagantes.
O estudo foi feito com base em nove capitais analisadas: Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo. A NTU comparou o desempenho do setor levando em consideração os meses de abril e outubro de cada ano.
COMBUSTÍVEL E FROTA
O levantamento também mostra que a frota e o preço do combustível também impactam diretamente no comportamento do setor de ônibus. Dados mostram alta variação no valor do diesel e redução do número de veículos em circulação.
Conforme divulgado pela NTU, a variação acumulada do diesel foi 11,2% superior ao Índice Nacional de Preços Amplo ao Consumidor-IPCA em 2017. “Nos últimos 19 anos o aumento do óleo diesel foi 254,1% superior ao IPCA e 171,5% superior ao valor da gasolina no mesmo período” – informou a associação, em nota.
A associação ressaltou que somente o óleo diesel representa 22% do custo total do sistema, em média. “Considerando a variação acumulada do óleo diesel ao longo do ano de 2017, que foi de 8,4%, isso representa um impacto direto de 1,9% nos custos e, consequentemente, nas tarifas”.
A frota, por sua vez, teve redução de 6,7% em 2017, comparando a 2016, de acordo com os índices médios alcançados nos dois meses analisados pela NTU. Desde o início do monitoramento do índice, em abril de 2013, houve uma redução de 10,9% da frota de ônibus total dos nove sistemas de transporte considerados pela associação.
A idade média da frota, por sua vez, apresentou aumento pelo sexto ano consecutivo em 2017, aumentando 9,6%. Nas nove capitais analisadas, passou a ser de cinco anos e seis meses, considerando o valor médio dos meses de abril e outubro do último ano.
PROPOSTAS E SOLUÇÕES
Durante a apresentação da NTU na Lat.Bus Transpúblico 2018, nesta quarta-feira, 1º de agosto, o presidente da associação, Otávio Cunha, reforçou que um dos fatores que ocasionou a queda é que no Brasil o transporte público quase não conta com subsídios do poder público e, portanto, os custos caem sobre os passageiros.
NTU apresentou seminário nacional na Lat.Bus. Foto: Alexandre Pelegi
Para que o transporte público alcance grande parte do território urbano e da população, seis programas de ação integrados foram propostos pelas empresas de ônibus, durante a Lat.Bus:
1 – Programa de qualificação da infraestrutura para o transporte público, que propõe a implantação de 10 mil quilômetros de corredores ou faixas exclusivas para ônibus em 111 cidades brasileiras com mais de 250 mil habitantes, com investimento de R$ 3 bilhões.
2 – Programa de padrões de qualidade para o transporte público, que definirá critérios e metas de melhoria, permitindo a redução dos tempos de viagem e maior regularidade da prestação de serviços.
3 – Programa transporte público como instrumento de desenvolvimento social, que pretende recuperar parte dos usuários excluídos do serviço por meio de uma nova política tarifária e aproveitar o tempo de viagem para atividades educativas e de cidadania.
4 – Programa de transparência para o transporte público, que vai divulgar para toda a população as informações sobre oferta, demanda, receitas e custos do transporte coletivo.
5 – Programa de custeio do transporte público, que propõe a cobertura de até 50% dos custos do serviço com receitas extratarifárias e desonerações, para reduzir a tarifa e permitir o retorno de pelo menos 20% dos passageiros, que deixaram de utilizar ônibus nos últimos anos.
6 – Programa de segurança jurídica dos contratos para que as concessões dos serviços de transporte público sejam feitos com editais e contratos claros, bem detalhados, debatidos com a participação da sociedade e que tenham mecanismos que garantam um equilíbrio econômico-financeiro da rede de transportes e boa prestação de serviços.
Otávio Cunha também usou um argumento diferente para defender o investimento no transporte coletivo: a gravidade dos acidentes de trânsito no país.
Mostrando dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), que apontam que o transporte coletivo responde por apenas 1% dos acidentes, Cunha perguntou: “o que falta para o poder público entender que investir em ônibus e transporte de massa é uma maneira de preservar vidas?”
O presidente da associação falou ainda sobre a melhoria do sistema como um todo, desde a imagem do veículo ônibus – visto como transporte ruim – até a capacitação da mão de obra do setor, a necessidade de fontes de financiamento extra-tarifárias (constituindo uma cesta de recursos dos três poderes, como a Cide e a desoneração), e o investimento em tecnologias (bilhetagem) e infraestrutura (pontos de ônibus, corredores).
Finalizando, Cunha disse que a associação encaminhou aos candidatos à presidência uma pauta para garantir a prioridade necessária à mobilidade urbana.
Confira a carta enviada pela NTU às principais candidaturas dos presidenciáveis.
“O transporte por ônibus pode ser tão bom quanto o metroferroviário, mas precisa de investimento, porque isso custa caro”, disse Otávio Cunha. “Um dinheiro que é essencial para o país”, finalizou.
Jessica Marques para o Diário do Transporte
Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transportes